O dia dos namorados do PSDB
No dia dos namorados, o PSDB resolveu trocar anéis de compromisso com o PMDB; renovar o vínculo, sedimentar o compromisso. A aliança, antes de prata, agora é de metal menos nobre: a conveniência. Há, em ambos os partidos, parentes em perigo, então é necessário algum sacrifício para salvar esses entes queridos.
Hoje, tucanos e peemedebistas compartilham objetivos comuns de preservar a espécie. Irônico, eram os tucanos os que mais vociferavam contra o sistema político, contra a corrupção. Agora, ponderados, exibem o comedimento e a moderação que não tiveram até recentemente. Esquecem que foi Aécio Neves quem pediu a impugnação da chapa Dilma-Temer; apressaram-se ontem ou não era sério?
Se no passado romperam com o PMDB por conta de Qüércias e Sarneys, isto foi em outro século. Mário Covas é só um quadro na parede, outra determinação política, outra massa crítica. Uma relíquia, uma língua morta; coisa que não existe mais. Com o tempo, a realpolitik se impôs: afinal, o que é pagar pela goela quando que o está em risco é o pescoço?
Dizer que fazem o que fazem em nome do Brasil é forçar a barra; no máximo, se mobilizam por interesses que moram logo ali: em São Paulo, em Minas Gerais; Aécio Neves, Geraldo Alckmin; novas oligarquias que o Brasil moderno, que anda para trás, revisita.
Mas, o que a conveniência uniu a necessária renovação política não separa: firmou-se um pacto circunstancial, que cobrará prêmios pela eternidade; ficará na história. Seus membros terão, agora, dificuldades em mencionar, com asco como faziam aos quatro ventos, as mazelas do lulopetismo; na verdade, essa noivado até interessa ao PT.
Os mais precavidos — ou menos incisivos — afirmam que a relação pode não durar e a separação não tardar; dependendo dos fatos, haverá uma "DR". Nonsense total: o que não depende dos fatos? Os fatos já estão aí a sugerir, pelo menos, algum afastamento de modo a que enxergasse com perspectiva. Quantos fatos mais o PSDB precisaria?
Alguns bem que tentaram, mas os tucanos, no geral, perderam a chance de se reinventar; fazer a necessária autocrítica, enterrar seus mortos. Erguer a cabeça, seguir em frente; refundar a tal social-democracia que reivindicam. Como avestruzes, no entanto, se esconderam e apenas deixarão maior o vazio ao centro do espectro político. Contribuirão para consolidar a polarização; darão vez à antipolítica.
Pedem mais tempo, escudam-se no biombo da crise econômica. Será que alguém acredita mesmo que esta será a agenda de Michel Temer e do PMDB, preocupados, antes, em salvar a pele? No mais, se a crise econômica é séria, sério também é o colapso da democracia. A primeira, a economia, depende da segunda, tanto quanto o contrário.
Entre o salto mais ousado e independente, preferiram a segurança duvidosa do muro. OK. Problema do PSDB e de seus filiados. Mas, para o país será importante saber como se posicionarão quando o presidente da República for denunciado; continuarão a procrastinar? Como se comportarão quando o ministro Fachin for difamado na CPI que armam; quando Rodrigo Janot for substituído, em setembro? O PSDB deve respostas à Lava Jato que ajudou a despertar.
O resto é dissimulação, matar amanhã o velhote que morreu ontem: "o inimigo é o PT" — ou será que tudo é armação da mídia? Conversa para desinformados. O inimigo do PSDB mora dentro dele próprio. No Brasil, a maioria dos partidos é assim. O PSDB é só mais um. De sua trincheira, os petistas sorriem; comemoram o presente do dia dos namorados. A política tem dessas ironias.
Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
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