Temer se refugia como auxiliar de si mesmo
Nos últimos dias, um maior protagonismo de Michel Temer se faz notar. O presidente assume ele próprio a coordenação política de seu governo, papel que caberia a importante auxiliar – importante, mas, ainda assim, auxiliar. O presidente perdeu Geddel Vieira Lima, perdeu Eliseu Padilha e tantos outros encontram-se na berlinda. Então, "sem ter tu, vai sem tu mesmo"… À luta.
Ao seu modo, conduz negociações e, pessoalmente, define a ocupação dos espaços no tabuleiro do poder de Brasília; deixa de ser a última voz, o árbitro dos conflitos para ser a única via; perde a instância de apelação. É um risco. Mas, sentindo o cerco se fechar em torno de importantes membros de seu governo, parece disposto a implementar ele mesmo a sua fuga para frente.
Como quem foi jogado ao rio, aprende a nadar ou, antes, a se segurar na boia salva vidas mais próxima, à disposição.
Sua iniciativa tem lógica e estratégia: fugir dos maus ventos da política, recorrendo à brisa que sopra certa percepção de que os piores dias da economia estariam em vias de superação. Faz sentido: despreza as más notícias, recorre ao que poderia haver de positivo. Ocupa as manchetes, retirando dali os vazamentos oriundos da Operação Lava Jato. Em nome da superação dos problemas, pede proatividade do Congresso.
A primeira questão a saber tem impossível reposta: como saber se seus propósitos são realmente sinceros? Estará disposto a atropelar as idiossincrasias da Câmara, no geral, e do PMDB, em particular, passando o trator por sobre interesses difusos, como, por exemplo, os de Renan Calheiros? Esta será sua primeira batalha. Difícil imaginar com quais aliados poderá contar.
Mas, muito bem. Em sendo sincera a disposição presidencial, a segunda questão reside em descobrir se a proatividade em reformar realmente desatará os nós que amarram a agenda ou se, ao contrário, acelerará contra ela toda uma sorte de reações e articulações.
Reforma da Previdência, Reforma Tributária, Reforma Trabalhista… Tudo ao mesmo tempo e agora! Cada uma delas chama contra si reações defensivas: na Previdência, as corporações das aposentadorias especiais; na Trabalhista, os sindicatos e os trabalhadores em geral; na Tributária, governadores e prefeitos interessados na mais vantajosa divisão da arrecadação. Proatividade ousada.
Se sua assessoria hoje é um vazio, no parlamento, o presidente terá o auxílio de operadores como Romero Jucá (PMDB-RR), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e André Moura (PSC-SE). Os dois primeiros, implicados com a Operação Lava Jato; o terceiro, réu em várias ações no Supremo, com ligação umbilical a Eduardo Cunha – ex-deputado cassado e preso em Curitiba. Agentes políticos com esta qualificação estariam dispostos a dar tempo, energia, foco total às reformas?
Também parecem faltar os agentes de diálogo com a sociedade, capazes de segurar a onda da reação dos grupos de interesse. Apoiadores de primeira hora como Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SD-SP), já sinalizam cair: não se sentem confortáveis e nem avaliam como "oportunas" reformas que afetam suas bases.
Em sua fuga para frente, Temer, portanto, aparece só; surfando no prestígio da respeitável equipe econômica que formou. Prestígio que, no entanto, tem limites e cujo papel é evidentemente técnico. Esperar que Henrique Meirelles articule o Congresso Nacional — somente porque o mercado assim deseja — é, possivelmente, repetir o erro que se cometeu com Joaquim Levy.
Além disso, as reformas carecem não somente de articuladores — de outro nível e outra condição –, mas também de comunicadores capazes de esclarecer quem, afinal, perde e quem ganha com elas. Cartazes virtuais alarmistas de nada servem. Assustam e, talvez, revoltem. O esforço didático, paciente e pedagógico é indispensável.
No presidencialismo, este papel é, por definição, do chefe de Estado e de Governo. O estilo é o homem, porém: Temer parece se ajustar mais aos bastidores. Às vezes cabe; normalmente, não basta. A dinâmica do Legislativo não deve se confundir com as exigências do Executivo. As lógicas são distintas. Temer não é presidente da Câmara; quis o destino que se tornasse presidente da República.
Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
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