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Blog do Carlos Melo

Expectativas e aflições nos números do Ibope/CNI

Carlos Melo

28/06/2018 13h16

Arte UOL

A distância daqui até a eleição ainda é longa; o país vive a ansiedade e a dispersão de uma Copa do Mundo, as coligações não estão definidas e, na volatilidade que tem sido comum na política brasileira, muita coisa pode acontecer. Portanto, neste momento da disputa, pesquisas eleitorais não são de modo algum jogo jogado. Seu poder preditivo ainda é reduzido. Contudo, seus números já indicam realidades a levar em conta.

Vamos aos números da pesquisa Ibope/CNI, divulgados na manhã desta véspera de São Pedro.

Algumas ponderações são óbvias: o ex-presidente Lula continua sendo a principal referência eleitoral e política do país; quando no jogo, atinge índices na ordem de um terço do eleitorado. Extraordinário, para quem está há quase três meses preso numa cela da Polícia Federal em Curitiba-PR. Nunca se sabe o que, afinal, pensa ou o que decidirá a Justiça nacional, mas, aos olhos de hoje, parece pouco provável que Lula seja candidato.

Dessa forma, quando colocado em seu lugar o petista Fernando Haddad, os sorrisos dos petistas de fecham: o ex-prefeito figura com apenas 2% das intenções de voto. Nota-se que a força eleitoral é de Lula, não do PT.

Sem o ex-presidente, Marina Silva, aparentemente, é a maior beneficiada, salta de 7% para 13%. Mas, talvez não seja bem assim: nesse cenário (sem Lula), o número de votos Brancos/Nulos/Não sabe/Não respondeu salta de 28% para 41%. Seriam então os "não votos" os mais nitidamente influenciados pela retirada do ex-presidente. A diferença (13%) seria correspondente à quantidade de eleitores que se manifestam em protesto à retirada de Lula do páreo? Pode ser.

E assim sendo, poderiam a propaganda eleitoral petista e o apelo de Lula, transferir esse contingente de eleitores, que não se definem por Marina, para Fernando Haddad, colocado como "o candidato de Lula"?

Somente o tempo dirá. Nas próximas abordagens, será necessário ficar de olhos atentos para eventuais movimentações de Branco/Nulo/Não sabe/Não respondeu. Eles podem conformar algum tipo de tendência, que seja de manutenção de um elevadíssimo grau de abstenções em mais esta eleição, uma vez que isto se deu recentemente na extraordinária eleição do estado do Tocantins; ou a transferência a algum candidato identificado como "sucessor de Lula".

Outro aspecto da pesquisa é a irredutibilidade dos números de Jair Bolsonaro. O deputado parece ter-se consolidado num patamar de intenções de voto do qual não desce nem sobe. Algo entre 17% (Ibope) e 19% (Datafolha, 07/06/2018) seria seu piso e seu teto de votos? Também aí somente o tempo dirá.

E quanto a Geraldo Alckmin, o que dizer? O ex-governador, candidato do PSDB, resiste teimosamente encalhado em torno de 6% ou 7% dos votos. É cedo para dizer que este será mesmo do destino do tucano. Mas, é fato que esses números ressurgem num momento péssimo para Alckmin, uma vez que seus aliados duvidosos e inimigos íntimos voltam a especular com sua substituição por João Doria.

Nos próximos dias, os números do Ibope, que não haja dúvida, servirão para solapar ainda mais seu chão. Menos pelos números e mais pelo desespero e pela dinâmica da política do autodenomiando "Centro", Alckmin será ainda mais constrangido. Um processo que poderia ser evitado, mas não será. Também aí o tempo dirá se o tucano resistirá ou não.

Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.

Sobre o Autor

Carlos Melo é paulistano, filho de açorianos e nasceu em 1965. Cientista político, com graduação, mestrado e doutorado na PUC-SP. Professor de tempo integral do Insper desde 1999; colecionou experiências, conquistou prêmios de ensino. Analista político, com colaboração em vários meios de comunicação; palestrante e consultor. Autor de "Collor, o ator e suas circunstâncias".

Sobre o Blog

Juízos de valor não importam, o leitor que construa os seus. O que se busca é a compreensão, sem certezas, nem verdades; antes, a reflexão. É o canto de um homem sem medo de exalar dúvidas. "Nem o riso, nem a lágrima; apenas o entendimento", diz Spinoza; "eu quase de nada sei, mas desconfio de muita coisa", arremata Guimarães Rosa.