A lógica da propaganda do PMDB na TV
Não pode ser limitada a isto, mas em muitos aspectos a política é a arte da dissimulação. O excesso de franqueza de Rubens Ricupero, em 1994: "o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde". Transformar pequenos feitos em grandes conquistas; reduzir grandes escândalos a pequenos abalos. É do jogo. E quando não houver saída, orienta o manual que a vitimização é o melhor caminho. Diante do perigo, grite: "é golpe!"
As inserções do PMDB, na TV, são, assim, propaganda de manual: o governo Temer surge, então, como o grande transformador histórico: "nunca se fez tanto…"; suas agruras são resultado de "tentativas de golpe" — Rodrigo Janot transformou-se em vilão; o presidente da República foi metamorfoseado em líder, estadista; como se o inseto de Franz Kafka acordasse príncipe.
Como diz a parlenda: "entrou por uma porta, saiu pela outra; quem quiser que conte outra…". A estratégia é manjada e não é implausível que surta efeitos: no sensacionalismo que se estabelece em torno da polarização "Lula / Bolsonaro", vai se constituindo um clima de aflição que clama por um candidato de "centro", uma opção, o tertius, a evitar o presumível caos.
Em virtude disso, parte da sociedade e dos tais mercados, não apenas aceitam como se deixam docemente levar pela propaganda peemedebista, que, nesse sentido, vem a calhar. Mantendo o status quo, mantem-se o prumo da economia. E o prumo da economia parece ser tudo o que importa, como se não houvesse alternativas para mantê-lo.
O fato é que o PMDB, com a melhora da economia e o medo de que seus rumos possam ser alterados, investe na propaganda para superdimensionar seus efeitos. Com isto, conta ter relevância no jogo de 2018.
Além disto, o grupo que hoje o comanda a legenda possui máquina: centenas de prefeituras, milhares de parlamentares e mandatos espalhados pelo território nacional, recursos federais e o tempo de TV, na eleição. Um dote nada desprezível, sobretudo, quando se sabe como o voto no Brasil é influenciado pelo clientelismo e pelo curral eleitoral.
Com isto tudo, será muito difícil, quase impossível, para o PMDB e seus aliados — incluindo parcelas do PSDB — abrirem mão de candidato presidencial, confiável, na eleição do próximo ano.
E não se trata apenas de fazer uma grande bancada de modo a influenciar o próximo governo — como o PMDB se especializou em fazer ao longo das últimas décadas. Desta vez, é diferente: será mesmo um imperativo vislumbrar concretamente o controle do governo. E para isto estar, desde cedo, é necessário estar acordado com o próximo presidente da República, garantido, de largada, espaços, esquemas e conexões nos mais diversos quadrantes do poder político.
Trata-se, portanto, da manutenção do atual esquema de poder. E o candidato que o esquema requer precisa ser do grupo ou fechar com ele; selar compromissos prévios, sendo crível e comprometido a ponto de cumpri-los: não deixar ninguém à mingua, nem na chuva ácida exposto à Operação Lava Jato.
Que ninguém se iluda: a questão programática econômica é instrumental, serve para atrair aliados, conquistar apoios externos e criar o clima otimista de recuperação; está a serviço do esquema, não o contrário. Ok, há ganhos econômicos de curto prazo. Mas, suas bases serão politicamente sustentáveis e institucionalmente saudáveis? Eis um ponto que a propaganda não revelará.
Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.