A reforma política novamente como dissimulação
Enquanto "Espera Janot" como quem espera o carrasco, parte do sistema político maquina uma lei da salvação. Independente da lista, lavar a imagem e salvar o pescoço dos eventuais envolvidos nas delações premiadas que povoam a Operação Lava Jato assumiu ritmo de urgência – é pra ontem. Não se sabe ao certo o que fazer, mas sabem que alguma coisa precisa ser feita.
Quando isto ocorre, não dá outra: volta-se a falar da necessária "reforma política". Embroma-se com questões de fato importantes: reduzir número de partidos, rever os custos das campanhas, impedir os tais conluios entre empresas e políticos e coisa e tal. Tudo de fato necessário, e muitas outras medidas também. O sistema é esperto como o diabo: sabe dissimular para mudar tudo e não mudar nada.
O tema reforma política, mesmo para um analista profissional da política, tornou-se uma questão constrangedora. Muro de todas as lamentações, remédio para todos os males, a ideia sempre volta à tona na hora do sufoco, como aquele sujeito que já cometeu o pecado e só lembra de rezar por medo do castigo.
Saber ninguém sabe, mas há uma desconfiança danada de que a intenção de retomar o assunto tem apenas intenções ocultas: passar uma régua nos maus feitos de ontem, esconder marcas e aliviar a alma pesada, aflita à espera da lista de Janot. Resolver os passivos dos Caixa 1, do Caixa 2 e, sabe-se lá, do Caixa 3. No fundo, no fundo, no fundo… Aprovar uma anistia.
Ok, aprovar leis é da atribuição dos parlamentares, mas legislar em causa própria sempre tem um custo de imagem. Sobretudo, para aqueles que ontem vociferavam contra a corrupção dos outros e hoje, quando as denúncias batem à sua porta, tergiversam com considerações escapistas do tipo: "hábito", "cultura", "vício", "tradição", qualquer nome que alivie suas imagens. A questão é que "não cola".
O próprio presidente da República sinaliza agora que arregaçará as mangas e se mobilizará pelo tema. Temer já foi presidente da Câmara por três ocasiões, ameaçou várias vezes encaminhar soluções para o quiproquó do mau funcionamento do sistema político, mas nada vingou de verdade.
Nem precisa tanto. Há bons projetos no Congresso, um deles, uma Proposta de Emenda Constitucional de autoria do senador capixaba, Ricardo Ferraço (PSDB-ES). Dá conta das questões de funcionamento e propõe substancial melhora para o sistema eleitoral. O presidente não precisa inventar a roda; basta, com sua base, dar sequência à proposta existente.
No mais, a Cesar o que é de César: para encontrar saídas, o acerto de contas com a lista de Janot precisará de conversa séria. Não de dissimulações.
Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
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