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Blog do Carlos Melo

Joaquim Barbosa acelera a eleição

Carlos Melo

27/04/2018 12h59

O caminhão do tempo atropela a eleição. Foto: Nivaldo Lima/Futura Press/Folhapress

Gradual e lentamente, a temperatura eleitoral vai se elevar conforme a ansiedade do mercado financeiro, da mídia, dos políticos e, também, da Justiça se eleve. Enquanto o eleitor comum passa a léguas de distância do assunto, a aflição de toda essa gente acelera o passo da conjuntura, deixa partidos e dirigentes afobados, forçando-os a se definir mais rapidamente do que seria normal e razoável para esta época do ano eleitoral.

Foi isto o que aconteceu ao longo desta semana. O leitor comum — por distante — pode não ter se dado conta, mas os bastidores ferveram de disputas, de angústia, de incertezas que, desse modo, vão puxando a corda da ansiedade, asfixiando os candidatos. A eleição deu vários passos adiante, pulou algumas casas.

Pode ser cedo, ainda. Mas, chega um momento em que o cedo tornou-se tarde, tarde demais. Isso não é determinado pelo calendário, mas pelo tempo da política que neste ano está mais acelerado.

Quem mais sentiu isto foi Geraldo Alckmin. O candidato do PSDB é dia sim e o outro também alvo de especulação: uma vez que derrapa nas pesquisas, ora será substituído incontinente por João Doria — como se Doria tivesse a eleição garantida —, ora anuncia-se que fechará acordo com o MDB, cedendo a vice, o que de modo algum parece interessar ao ex-governador.

De todo modo, o dado concreto é que Alckmin não parece empolgar nem seus correligionários. O máximo que tem conseguido são declarações formais e forçadas, de Fernando Henrique Cardoso, por exemplo. O constrangimento é evidente. Diz-se que desenvolve um trabalho intenso de bastidores, mas os resultados não são visíveis.

Como candidato, permanece apático até mesmo em sua terra, o estado de São Paulo, onde os as pesquisas revelam números pouco estimulantes.

Igualmente, o tempo urge para o MDB. É claro que a candidatura de Michel Temer não deve ser levada a sério. O presidente se mobiliza apenas na presunção de ser o que não é, e na pretensão não revelada de encontrar um palanque com cobertura para lhe proteger do sol e da chuva que virão, ano que vem.

Já a candidatura de Henrique Meirelles parece servir mais para negociar do que para competir. Meirelles é Plano B ou C. Será candidato se não houver nada de mais interessante para os próceres do MDB nacional e para os interesses regionais da sigla. E, claro, ainda assim, tudo sob suas próprias expensas.

No PT a aflição toma corpo. Para muita gente, somente agora tem caído a ficha de que Lula ficará mesmo sob a guarda da Justiça, preso numa cela de Curitiba. Não poderá ser candidato. Mesmo o ex-presidente já externou em carta ao partido que, mesmo que a luta continue, companheiro, prefere, na verdade, a liberdade à candidatura, como é natural.

O PT insiste, porém, com Lula porque — José Dirceu já deu a dica — racharia em 4 ou 5 partes, se neste momento tiver que se definir a qualquer opção além de seu condestável. Sem Lula, o PT é Superman diante da kriptonita.

Suas forças se esvaem, tornando-se um partido como os outros: rico de desgastes e pleno de problemas. Sabe — ou já desconfia — que, nessa conjuntura, o melhor seria juntar forças. Fala-se numa frente de esquerda, com PT, PCdoB e PSOL. Mas, que ganho haveria aí, além da reunião dos mesmos convertidos de sempre? Podem por teimosia até ir em frente, mas é pouco provável que assim, sós, eleitoralmente cheguem longe.

Os petistas mais realistas já não descartam uma aliança com Ciro Gomes, que sai da semana fortalecido pela fragilidade do PT. Além de favorecido pelo quadro do PT sem Lula, Ciro, paradoxalmente, também obtém vantagens em razão do sufoco geral que a entrada de Joaquim Barbosa no jogo eleitoral vem causando no sistema político.

Percebeu-se que Joaquim muda o jogo. Contra ele, os partidos precisarão de alianças até mesmo para não sucumbir a seus encantos eleitorais.

E assim, nesta semana que se encerra, o ex-ministro do Supremo foi quem voou em céu de brigadeiro. Aos poucos, parece convencer os renitentes do PSB — não há nada mais sedutor do que as perspectivas de vitória e de poder — de que pode, sim, ser competitivo; de que pode, sim, se disciplinar à vontade de um coletivo (será?). Tem conversado e diminuído resistências, regionais, inclusive.

Sutilmente, amplia seu nome em espaços importantes. Crítico do ultraliberalismo, colocou-se no campo da centro-esquerda, invadindo terrenos de Ciro e do PT. Descrito pelos jornais como o magistrado do STF que considerou constitucional a quebra do monopólio do petróleo, a concessão de status de ministro ao presidente do Banco Central, a contribuição de aposentados e a reforma previdenciária de Lula, abre pelo menos uma fresta das portas para o mercado financeiro e outros setores da economia.

O certo é que o caminhão do tempo vem em alta velocidade, atropelando os descuidados do caminho. Nesta semana, o caminhão se chamou Joaquim Barbosa e ele, de certo modo, fez com que todos corressem ou percebessem que é preciso se mexer. Barbosa acelerou o tempo e o tempo acelerou as disputas.

Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.

 

Sobre o Autor

Carlos Melo é paulistano, filho de açorianos e nasceu em 1965. Cientista político, com graduação, mestrado e doutorado na PUC-SP. Professor de tempo integral do Insper desde 1999; colecionou experiências, conquistou prêmios de ensino. Analista político, com colaboração em vários meios de comunicação; palestrante e consultor. Autor de "Collor, o ator e suas circunstâncias".

Sobre o Blog

Juízos de valor não importam, o leitor que construa os seus. O que se busca é a compreensão, sem certezas, nem verdades; antes, a reflexão. É o canto de um homem sem medo de exalar dúvidas. "Nem o riso, nem a lágrima; apenas o entendimento", diz Spinoza; "eu quase de nada sei, mas desconfio de muita coisa", arremata Guimarães Rosa.